Às vezes eu acho que seria capaz de suportar uma crise de rim sem que qualquer pessoa ao meu redor percebesse. Não chamaria isso de mau caráter ou estoicismo, pode ser só auto-preservação. Não sei se saberia passar por qualquer incômodo em público, e não me sinto confortável quando alguém se expõe de qualquer maneira. Não consigo lidar com o desconforto alheio, com a falta de tato alheia e tampouco com as variações alheias; penso que cada um deveria guardar-se pra si, sem que os outros fossem de qualquer forma responsabilizados ou expostos a sentimentos e situações que não são suas.
Custa às pessoas serem respeitosas ou agradáveis, falta-lhes uma certa sensibilidade para tratar com o outro. Estamos numa época em que as pessoas se expõem demais ou se travam demais, uma época em que não é incomum sermos encarados como um perigo para o outro ou julgados impiedosamente. Numa época em que as relações são burguesas, assépticas e hipócritas. Numa época em que a frustração se veste de distância ou de não-preocupação, cala fundo e transforma os atos.
O tratamento dado a um ou a outro depende do humor de quem trata, e os pesos e medidas são vários e variáveis. O conceito que te é dado é indelével, mesmo que se prove que você é exatamente o oposto do que pensavam de ti no início. Tudo é julgado logo de início, tudo é jogado em caixas e quebrado para que caiba. Os conceitos são estreitos e impiedosos. Todo mundo tem que ser isso ou aquilo, ninguém pode ser tudo ao mesmo tempo. Ninguém muda, e se muda não é visto com bons olhos. Todos têm que ser brancos bonitos cristãos bem sucedidos financeiramente fãs do Chico Buarque antitabagistas heterossexuais corretos defensores da moral da ordem e dos bons costumes. Ecologia é coisa quem não liga pro progresso e os Direitos Humanos servem para defender marginais. Se você mora em Brasília, tem que saber Direito, ter carro e estudar pra concurso, se você mora em São Paulo é o bem sucedido, se mora no Rio é Menino. Tudo bem colocado, bem encaixado.
Alguns prezam por esses e outros conceitos, e têm alguém preso no porão há mais de vinte anos. E eu vou ler Sartre pra manter minha sanidade.
2 comentários:
Te entendo, Ana. Moro na Bahia, sou negro e não toco berimbau "apesar" disso. rs Algumas pessoas simplesmente não entendem o porquê de não saber tocar. A pergunta que atormenta é: "O que fazer se o humano normalmente é tudo ao mesmo tempo e outras tantas vezes nada?"
Mora ai o motivo do sofrimento de muitos.
Belo post!
Abs
Pois é, meu camarada. As pessoas se acostumaram a esperar demais dos outros e de menos delas mesmas... pobre humanidade =(
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